quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Vocação: Encantar-se


 O encantamento e a surpresa fazem-nos intuir que a nossa vida sairá a ganhar se nos deixarmos conquistar.



«Rabi – que quer dizer Mestre – onde moras?» (Jo 1,38)




Olá, jovem

Já alguma vez, perante algo desconhecido, sentiste aquela vontade forte, intensa, irresistível de perscrutar, descobrir, conhecer, desvendar o mistério? Mais, aquela sensação de não fazer mais nada enquanto não conseguires saber o que se passa? É uma atracção terrível, por vezes doentia, mas que, quando é bem encaminhada, é uma força de vida, de entusiasmo que te pode levar à opção fundamental da tua vida: decidir por algo de grandioso, decidir por alguém.

Perfume desconcertante

Volto ao texto do Evangelho do mês passado (Jo 1, 38) e à pergunta de Jesus: «Que buscais?»
A pergunta deixou um rasto de curiosidade no coração daqueles dois homens. Afinal o que queriam? O que desejavam? Provavelmente ficaram desconcertados: O que dizer? O que fazer? Ainda não tinham reflectido nisso, simplesmente sentiam uma curiosidade imensa nascida nas palavras do seu mestre João: «aí está o cordeiro de Deus».
Mas também deixou um perfume de atracção, de encantamento. «Rabi [mestre] onde moras?», foi a pergunta, talvez balbuciante, que surgiu; uma mescla de curiosidade e admiração. Foi o suficiente para se deixarem entrar num dinamismo, num caminho, no qual já não são eles os guias, mas os guiados. «Onde moras» lança os discípulos nos dois caminhos gémeos da vocação. Por um lado, o Rabi ali presente, diante deles, desconhecido e que se quer deixar conhecer, que se expõe, à vista deles, que se abandona a eles, para ser conhecido, encontrado… vivido. Por outro, é também um compromisso que eles assumem de se pôr a caminho. A pergunta compromete-os na descoberta de algo. Não há desculpas para não fazer nada, para ficar indiferente.

Encontro encantador

A história de amizade pessoal com Jesus costuma começar em nós quando nos encontramos com alguém que já vive a sua história! Alguém que encontramos e nos fala desse Jesus com um brilho nos olhos, muito especial. Dá testemunho dele como quem aprendeu o Evangelho da sua própria boca, anuncia-o como quem revela as confidências que descobriu numa profunda e secreta relação de amizade interior. Às vezes nem guardamos mais do que um momento em que sentimos o coração encantado por aquela pessoa e por Cristo que vive nela. É uma experiência, mais ou menos, profunda de encantamento por Jesus, uma intuição inquietante de que ele é verdadeiro e apaixonante e os seus gestos podem encher de sentido os nossos dias.
Quando isso acontece, parece que nos caíram umas quantas escamas dos olhos e o rosto de Jesus ganha uma quantidade de contornos novos e sedutores que antes não tinha. Imediatamente, há como que uma intuição interior, um sexto sentido do coração, que nos diz que se está a abrir um caminho qualquer. O encantamento e a surpresa são os primeiros laços da sedução e nos fazem intuir que a nossa vida sairá a ganhar se nos deixarmos conquistar.

Os segredos de Deus

Infelizmente, a maior parte dos cristãos nunca passou sequer por aqui! Talvez por falta de mediações, também por falta de atenção e disponibilidade interior! O que é certo é que, enquanto Jesus de Nazaré não se cruzar connosco de maneira a surpreender-nos, a fazer-nos parar maravilhados e a dar-nos vontade de lhe perguntarmos «onde moras?!», ainda não temos verdadeiros motivos para o seguirmos! Mas quando nos encantamos, tudo muda! Então desabrocha no nosso íntimo, ao mesmo tempo, uma paz inexplicável e uma vontade enorme de continuar a desvendar os mistérios, os segredos. Sim, fazemos a experiência de ser possível penetrar nos segredos de Deus, nos quais se iluminam os segredos da nossa própria Vida.
No início, a vocação é assim: ainda não compreendemos muito, simplesmente ficamos encantados, admirados, maravilhados, com vontade de conhecer mais e melhor, com o desejo de penetrar os mistérios, o segredo de Deus, que é a sua própria vida em nós e na humanidade.

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